Previdência: Mudança de paradigmas

Danielle Villas Bôas Agero Corrêa

Muito se fala da reforma previdenciária e pouco sobre os reais causas do déficit ou desequilíbrio nas contas previdenciárias. Alguns pontos merecem destaque: Todos os militares que ingressaram antes de 2001, mantém o benefício de pensão vitalícia para as filhas solteiras com contribuição adicional equivalente a apenas 1,5% da sua remuneração. Pasme, este é o percentual para manter a pensão integral para as filhas maiores! A pensão para filhas solteiras de civis foi instituída em 1958 e extinta em 1990, mas quem já recebia o benefício naquela época o mantém vitaliciamente. O que ninguém fala é o real motivo da criação desse benefício.

Quando instituída para as filhas dos militares, ainda na década de 30 e 40, tinha efeito indenizatório. Isso porque, as filhas dos militares não conseguiam estabelecer um vínculo afetivo, pois seus pais eram constantemente transferidos de uma base para outra, dessa forma as filhas não conseguiam estabelecer vínculo afetivo e não se casavam. Quando suas mães, únicas beneficiárias da pensão, faleciam, as filhas ficavam em situação de extrema pobreza. Visto que nessa época ainda era pouco comum mulheres ingressarem no mercado de trabalho, dependendo diretamente do pai e/ou do marido. Para corrigir essa situação, o legislador previu o pagamento de pensão a filhas maiores, desde que solteiras. Ou seja, havia uma real situação que justificava o pagamento do benefício de pensão às filhas dos militares, que não trabalhavam e não tinham outra forma de subsistência. E, hoje, qual a justificativa? Mulheres que, em plena capacidade laborativa, para dar continuidade ao pagamento da pensão, deixam de se casar no civil, opcionalmente, embora, a maioria mantenha união estável. E qual a justificativa do pagamento para a pensão dos civis? Nenhuma.

Outra questão que merece destaque é a aposentadoria dos professores. Quase 70% da folha de pagamento de todos os Entes Federativos é composta pela carreira de magistério.
A ideia original da redução de tempo na aposentadoria do professor era o uso do pó de giz, que era um agente nocivo, muito utilizado até o início do ano 2000 e que causava diversos problemas pulmonares culminando na aposentadoria precoce por invalidez.

Todavia, em que pese não ser considerada uma aposentadoria especial desde os anos 1980, a justificativa para o tempo de contribuição e idade serem reduzidos em cinco anos se mantém por causa dos problemas da profissão, como o desgaste psicológico e até riscos físicos em determinadas regiões do país.

A Constituição Brasileira é cidadã e previu diversos direitos. Mas, até 1998, data edição da Emenda Constitucional nº 20, não dispunha de mecanismos para o financiamento da previdência social, ou seja, até 1998, não existia correlação entre a concessão do benefício e o caráter contributivo. Sendo assim, no caso específico dos Regimes Próprios de Previdência Social – RPPS, a causa principal do déficit previdenciário é a ausência de acumulação de ativos garantidores entre as décadas de 80 e início dos anos 2000 em virtude da carência do lastro contributivo. Pois, muitos municípios quando instituíram o Regime Jurídico Único deixaram de contribuir para o INSS e, somente passaram a recolher a parte patronal e a descontar efetivamente a contribuição previdenciária dos servidores para o RPPS após a Emenda Constitucional nº 20/1998.

Outro fator é a criação de normas sem estudo de viabilidade financeira, orçamentária e tampouco atuarial. Talvez, por isso, a reforma da previdência trazida pela Emenda Constitucional nº 103/2019 tenha instituído a possibilidade de uma alíquota para aqueles já aposentados, que ganham a partir de um salário mínimo. Somente os servidores públicos que recebam acima do teto do RGPS, têm a obrigatoriamente de retenção compulsória sobre o valor que excede o teto.

Ademais, verifica-se em alguns Entes Federativos, o Estado do Rio de Janeiro, por exemplo, a Lei nº 285/79, ratificadas pelo artigo 283 da Constituição Estadual e pela Lei nº 1951/1995, autorizava o recebimento de pensão por parte de legatário indicado em testamento, ou seja, o servidor público que não tivesse cônjuge, companheiro ou dependente poderia legar a pensão por morte a beneficiários de sua indicação. Somente em 2004, no julgamento das ADI’s nº 240 e 762, o Supremo Tribunal Federal reconheceu a inconstitucionalidade das normais infraconstitucionais supramencionadas. Até 2015 alguns legatários ainda recebiam o benefício. No âmbito da União, em 1994, foi criada a DRU, com o nome de Fundo Social de Emergência (FSE), logo após o Plano Real. No ano 2000, o nome foi trocado para Desvinculação de Receitas da União. A DRU foi uma regra criada que estipulou que 30% (até 2016 era de 20%) das receitas da União ficariam provisoriamente desvinculadas das destinações fixadas na Constituição. Com essa regra, 30% das receitas de contribuições sociais não precisam ser gastas nas áreas de saúde, assistência social ou previdência social. Ou seja: se tivesse déficit previdenciário, mensalmente a União não poderia retirar 30% para utilizar em outras áreas que não da seguridade social.

Danielle Villas Bôas Agero Corrêa é presidente do Instituto de Previdência dos Servidores de Nilópolis (PREVINIL)

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