Estresse é sentença pesada também para advogados da Baixada Fluminense

Inscrita na OAB Nova Iguaçu/Mesquita, subseção que soma cerca de 4 mil advogados, a advogada Priscila Martins, moradora no bairro Valverde, em Nova Iguaçu, especializada nas áreas família e criminal, além de ser defensora dos direitos da mulher, inclusive produz conteúdo jurídico às mulheres no Instagram @advpriscilamartins, sabe como o estresse e a ansiedade debilitam a saúde mental. O estresse começou antes da ansiedade e, segundo ela, os sintomas só foram percebidos quando já estava sofrendo os sinais físicos do problema. “Um certo dia, saí para fazer uma audiência criminal. Estava tão preocupada com o resultado da audiência que eu esqueci totalmente de me alimentar ou beber água. O medo de falhar e causar um transtorno na vida do meu cliente me deixou esquecer literalmente da minha alimentação. Só lembrei que estava há horas sem comer quando cheguei em casa, às 20h. O detalhe é que a audiência começou, às 13h, e terminou às 18h. Simplesmente esqueci de comer por esse longo período”, recorda.

Os altos níveis de estresse e de consumo de álcool estão aumentando mais entre as advogadas do que entre os advogados. É o que mostra estudo realizado nos Estados Unidos por Justin Anker, da empresa Krill Strategies LLC, divulgado recentemente. O cenário no Brasil não é tão diferente. Autora do primeiro estudo realizado no país sobre a saúde física e mental dos advogados, Fátima Antunes, psicóloga e professora universitária que ministra aulas na Baixada Fluminense, especialista em gerenciamento do estresse pelo International Stress Management Association (ISMA/BR), conta que o nível de exaustão dos que se dedicam a defender os direitos do cliente é muito elevado. 

Quem também conhece os efeitos do estresse com origem na atuação profissional é o advogado e Procurador do Poder Legislativo do Município de Belford Roxo, Everson José Ramos de Faro, 53 anos. Em decorrência do elevado nível de estresse, Everson Ramos desenvolveu uma fibrilação atrial (ritmo cardíaco irregular). Inclusive precisou ser hospitalizado. Após dois anos de tratamento médico e psicológico, Ramos se sente recuperado. Morador no bairro São Francisco de Assis, ele foi um dos participantes do estudo realizado pela psicóloga Fátima Antunes. “Já fui vitimado pelo estresse em razão da atuação como advogado. Por isso considero importante que todos os profissionais de direito procurem ajuda para evitar o abalo da saúde mental”, avalia.

No Brasil, há 1.220.576 profissionais de direito e cerca de 52% deste número são advogadas, 610.369 profissionais. É o que mostra o quadro da advocacia mantido pelo Conselho Federal da OAB. Autora do livro “Estresse em Advogados”, Fátima Antunes, disse que vem aumentando o número de advogadas com a saúde mental abalada. “O estudo que realizei e que deu origem ao livro ‘Estresse em Advogados’, aponta que as mulheres apresentam 11% a mais dos sintomas relacionados a questões psicossomáticas do que os homens. Esse fator pode estar relacionado à dupla ou tripla função feminina na sociedade atual. Elas vivenciam mais estresse, por serem mais impactadas pelos sentimentos de falta de tempo para a família e as inúmeras tarefas que precisam dar conta no dia a dia”, avalia Antunes.

Para Priscila Martins, a ansiedade a deixou com insegurança e impaciência. “Não baixou meu rendimento profissional, porque eu só consigo ficar em paz se eu finalizar o que é necessário naquele dia referente aos processos, vou dormir pensando nos processos e acordo pensando nos processos e prazos”, destaca. Com os alertas indicando que havia alguma coisa fora de ordem na saúde mental dela, a advogada Martins decidiu procurar ajuda psicológica. Com dois meses fazendo terapia, Martins diz que está se sentindo menos ansiosa e com mais paciência para realizar as demandas da profissão. 

“Se tenho um prazo que vai vencer durante a semana, consigo aproveitar o meu final de semana em paz e depois organizar a tarefa. Acho que a primeira coisa que nós advogadas devemos observar é que algo está errado e que precisamos de ajuda, pois quando nossa cabeça não consegue acompanhar nosso trabalho, ficamos desmotivadas e nos sentimos impotentes. Mas, na verdade, temos todo o conteúdo e o conhecimento. Portanto, só precisamos organizar nossos sentimentos e a nossa mente”, ensina a advogada Martins.

A psicóloga Fátima Antunes destaca que o estresse é uma realidade inquestionável no segmento da advocacia, que se estabelece principalmente a partir das demandas psicológicas associadas ao trabalho e ao perfil exigido do profissional. “Embora haja grande sofrimento por parte de muitos advogados, eles possuem dificuldade em assumir que precisam de algum tipo de suporte emocional. Na maioria das vezes atuam sozinhos e precisam resolver sozinhos as demandas que se apresentam. Muitos dizem que estresse em advogados não existe. Acho, porém, que com a situação da pandemia pelo novo coronavírus, as pessoas, hoje, entendem melhor que a saúde mental compromete a saúde física, as relações e os resultados do trabalho”, analisa.

De acordo com Antunes, diante da realidade estressante dos profissionais do direito,  é fundamental falar sobre o assunto, porque aumenta a possibilidade do entendimento sobre a importância de olhar com atenção e zelo pela saúde mental dos advogados, inclusive como forma de sobreviver à realidade da profissão. “Espero que as advogadas e os advogados entendam que cuidar da saúde psicológica é algo que os ajudará a obter melhor resultado na carreira”, avalia. No  perfil do Instagram @fatimaantunes.psi, a psicóloga Antunes faz atendimento às advogadas e aos advogados, além de produzir conteúdo sobre o tema. 

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